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Arroz de carreteiro – R$ 3,95

arroz carreteiro em uma travessa de cerâmica
Resolvi me lançar numa grande enrascada: recriar um prato tradicionalíssimo da gastronomia brasileira, principalmente na minha terra, cuja estrela é charque. Tô falando do arroz de carreteiro. 

Além de muito simples, esse prato é ótimo pra usar como recheio de outras preparações.

Ao contrário da moqueca, por exemplo, que a alma está na combinação do leite de coco, dendê e coentro, ou seja, dá pra fazer a base de banana da terra de boa, o principal ingrediente do carreteiro é uma carne. E como uma não consumidora de carnes, eis o meu desafio. 

No geral, eu não curto essa onda de veganizar pratos que costumam levar carne. Acho mais interessante descobrir novas combinações de sabores e inventar coisas novas. Mas nós, veganos, também somos filhos da Deusa da Memória Afetiva e às vezes queremos morder um negócio e lembrar da infância. Entende? Ou receber alguém em casa e mostrar o sabor de um prato regional. 

Aqui em Floripa, mesmo sendo litoral, a gente come bastante arroz de carreteiro. Na minha família, inclusive, nem era feito com charque, mas com as sobras do churrasco. Então a minha memória afetiva é de um prato que reúne arroz e um sabor defumado bem predominante

E tem uma coisa que  sempre amei mais do que o sabor nesse prato: a simplicidade. Ele costuma levar apenas uma carne salgada (charque, em geral), arroz, e cheiro verde. E a origem desse prato, como muitos outros da nossa gastronomia, é explicada pela necessidade. Trata-se de uma mistura que podia ser feita na estrada, durante as longas viagens dos carreteiros, os moços que viajavam em cima dos carros de bois no Rio Grande do Sul. 

Entendo que fazia algum sentido naquela época. Mas estamos em 2018. Temos ferramentas para conservar alimentos. Não precisamos mais montar em cima de animais, nem nos alimentar deles pra sobreviver. Há uma infinidade de plantas que viram comidinhas maravilhosas e duzentos mil tipos de veículos de transporte. 

Já que comecei a comprar a briga com os gaúchos, aí vai. A popularidade do arroz de carreteiro em todo o país se deve, principalmente, a essa galera do Rio Grande do Sul que deixou a sua terra para investir na pecuária em outras regiões do Brasil, como a Amazônia e o Cerrado. E é esse mercado o responsável pelo maior impacto ambiental do mundo depois dos combustíveis fósseis. 

Ou seja. Uma memória afetiva da nossa infância ou a realização de um simples capricho alimentar não justifica a destruição das nossas áreas de preservação ambiental, a nossa fauna, flora, a nossa água. E ainda tem a questão da dizimação dos povos indígenas. É pra alimentar esse gado todo que a gente compra sementes transgênicas e agrotóxicos, inclusive. 

Então tá na hora de começar a sair da zona de conforto, né? Ninguém vai ser menos feliz se largar o churrasco. Pode acreditar. 

Bronca dada, vou explicar como foi o processo de criação dessa receita. Primeiro: um arroz com legumes dificilmente iria atingir a textura e sabor que eu procurava. Precisei acionar um recurso pouco comum por aqui: a soja. 

E já imaginando a cara feia que você vai fazer ao ler que tem soja nessa receita, vou lembrar algumas coisas. Primeiro: é um mito que soja faz crescer peitos nos homens e faz mal pras crianças, tá? Não caia nessa. O que é prejudicial é o excesso de soja. Se você come muita comida ultraprocessada, tá comendo soja demais. É óleo de soja, lecitina de soja, margarina… Não esquece que os alimentos de origem animal também são atochados de soja, porque ela é a base da ração dos bois.

Mas pensa uma coisinha aqui comigo. Sabe de onde surgiu esse negócio de comer soja? Foi na China há milhares de anos. Os chineses e japoneses são os maiores consumidores de produtos a base de soja do mundo: tofu, shoyu, tempeh, missô, etc. E pensa: a saúde deles tá bem melhor que a da nossa população. Então a vilã dessa novela não é especificamente essa leguminosa em si, mas uso que a indústria faz dela

Em resumo: não tenha medo de soja. Evite comprar as versões transgênicas (sim!) e reduza ao máximo o consumo de alimentos industrializados. Feito isso, pode comer uma soja ou outra em paz. 

Pra essa receita, eu usei soja texturizada, aquela minúscula que muita gente confunde com carne moída. Quando bem temperada e preparada certinho, dá uma textura excelente pra receitas que tradicionalmente levariam carnes. Recomendo usar pra fazer molho bolonhesa, por exemplo, ou almôndegas. 

E atenção na hora de preparar. O segredo está na combinação de temperos e no passo a passo da preparação, tá? Fique atento e não pule nenhuma parte. Pra essa receita, é essencial que a soja seja preparada no forno, pra ficar bem sequinha e saborosa. Aliás, essa é minha versão preferida de fazer esse tipo de soja. Não costumo gostar do resultado quando feita apenas na panela. 

Então vamos lá.

Ingredientes para temperar a soja
⠂1 xícara de proteína de soja texturizada (de preferência não transgênica)
⠂2 xícaras de água fervente
⠂4 dentes de alho crus picados ou 2 colheres de sopa de alho desidratado
⠂2 limões
⠂pimenta do reino a gosto
⠂1 colher de chá de sal

Eu usei essa soja, feita em Curitiba. É bem barata e não é transgênica. 
Como eu fiz
Numa cumbuca, coloquei a soja, a água fervente e esperei 15 minutos. Escorri a soja com uma peneira e descartei essa água. Na mesma cumbuca, coloquei a soja, o alho, o limão, a pimenta e o sal e deixei na geladeira pegando sabor por, pelo menos, 4 horas. Quanto mais tempo deixar de molho, melhor. 

Soja temperada e indo pro forno!

Ingredientes para o arroz de carreteiro
⠂1 xícara da soja temperada
⠂1 pimentão verde 
⠂1 cebola
⠂1 xícara de arroz agulha (usei integral)
⠂2 tomates
⠂1 colher de sopa de raminhos de alecrim fresco (opcional)
⠂2 colheres de sopa de páprica defumada*
⠂2 folhas de taioba ou couve 
⠂4 colheres de sopa de azeite
⠂sal a gosto
⠂cebolinha a gosto

Observação: a páprica defumada é a estrela da receita, tá? Não pode faltar!

Como eu fiz
Liguei o forno. Numa assadeira, coloquei a soja já temperada, o pimentão, o tomate e a cebola picada em cubinhos. Acrescentei o alecrim fresco, o sal, o azeite e a páprica defumada. Misturei bem com uma colher e levei ao forno alto por 25 minutos (ou até a soja estar bem sequinha). Enquanto isso, cozinhei o arroz normalmente com água e sal numa panela grande. Quando faltava 1 dedo de água pro arroz secar e ficar pronto, acrescentei a soja, a taioba fatiada bem fininha e acertei o sal. Fiquei mexendo pra misturar tudo até a água secar. Joguei cebolinha picada por cima e pronto!

Observação: serve 4 pessoas que comem moderadamente ou 3 pessoas famintas. 

O resultado final desse prato é realmente MUITO surpreendente. Eu garanto. Além do sabor, tem bem menos sódio e gorduras que a versão original com charque. Aqui em casa eu e Lucio comemos tudo no mesmo dia, no almoço e na janta. Por levar ingredientes muito simples e baratos, já virou um dos nossos pratos queridinhos aqui em casa. 

Aqui em casa a gente comeu assim purinho no almoço e depois como recheio das folhas de repolho e molho de tomate. 
Essa receita é perfeita pra usar como recheio também. Você pode fazer pimentão ou folhas de repolho recheados com esse carreteiro. 

11 respostas

  1. Menina!

    Eu odiava proteína de soja, até que aprendi a fazer (na panela) e agora amo (pq é fácil de ter em casa e faço Rapidão). Super vou tentar essa de botar no forno.

    PS.: Carreteiro de sobra de churrasco é clássico gaúcho também, não so o de charque.

  2. Conheci seu blog e já fiz hoje! Fiz as alterações de acordo com minha geladeira! Não coloquei alecrim e acho q coloquei páprica picante no lugar da defumada! Ficou bem picante mas bastante saboroso!

  3. Oi, Ju! São realmente 2 colheres de SOPA de páprica defumada? Sempre coloco no feijão, mas achei muito pra usar de uma vez só… Obrigada desde já!

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